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Nunca tinha lido Philippe Claudel e talvez nunca lhe tivesse pegado se não me tivessem recomendado todos os livros dele - este em particular - tão veementemente. Disseram-me para esperar um ambiente pesado e alguma loucura. Relativizei o ambiente lúgubre por ainda trazer comigo os traumas da guerra civil nigeriana em "Meio Sol Amarelo", mas todas as descrições - reforçadas quase sempre com dupla adjetivação - remetem de facto para uma atmosfera cinzenta, sombria e melancólica. O protagonista, um velho, muito velho, que assistiu à morte de toda a família e se viu obrigado a refugiar-se num país que não conhece e onde falam uma língua que não percebe, reforça a soturnidade desta novela.
A neta recém-nascida que traz junto ao peito e de quem cuida como se nela se concentrasse todo o passado e todo o futuro é o elemento contrastante que acalma, que transmite serenidade e a certeza de que tudo está e ficará bem. É a ela que vai buscar a vontade imensa de continuar, de suportar no fim da sua vida um recomeço que o marginaliza.
Sentar-se num banco, num dia frio, e conhecer o Senhor Bark mostrar-lhe-á o poder de uma amizade que vai além das palavras que não podem ser compreendidas, com ele revolverá as imagens que traz agarradas à memória: da sua terra, do cheiro dos campos, dos sons das famílias que moravam lado a lado na aldeia que desapareceu do mapa e que estavam ligadas só por partilharem a existência, ali. Esta amizade e o futuro da neta que segura nos braços firmes vão mantê-lo vivo, consciente, e fazê-lo resistir muito para lá das suas possibilidades.
A escrita de Philippe Claudel é limpa, as frases curtas em capítulos curtos guiam eficazmente o leitor através dos diferentes cenários e apresentam-lhe as personagens, uma a uma, demorando-se nelas exatamente o tempo suficiente e necessário. É desta forma que resta, no fim da leitura, ao leitor, não mais do que o essencial.